Na
próxima eleição municipal, cerca de 4,5 milhões de eleitores votarão na cidade
do Rio. As leis eleitorais brasileiras e o papel da Justiça eleitoral garantem
grande peso às camadas mais pobres da população. O voto obrigatório e a Justiça
eleitoral contribuem para que essas camadas tenham peso nas urnas proporcional
ao seu tamanho. O acesso cada vez mais fácil ao voto, a maior lisura das
eleições e, consequentemente, maior confiança nos resultados eleitorais
incentivam a participação e diminuem os custos de votar, aumentando a
influência desses segmentos nas políticas públicas. Não é por acaso a ênfase de
partidos das mais diversas colorações ideológicas em políticas que os
beneficiam.
O retorno
eleitoral da população mais pobre é frequentemente visto como uma forma de
clientelismo. A eleição para o Legislativo municipal seria campo fértil onde
brota e prospera o paroquialismo. Vereadores com redutos eleitorais localizados
seriam defensores de interesses espúrios de suas clientelas, distorcendo a
representação. Não há lugar para representantes de correntes de opinião e
ideologias ou mesmo para aqueles que visam ao interesse geral dos moradores da
cidade. Mas não precisa ser assim e, na verdade, nem sempre é.
Vamos
primeiro aos fatos. Na ciência política, um dos principais indicadores de
paroquialismo é a concentração de votos, no caso das cidades, em um ou mais
bairros contíguos. Vereadores com votação concentrada seriam paroquiais ou
clientelistas, enquanto a votação dispersa caracterizaria o voto de opinião,
ideológico. Os resultados das últimas eleições municipais mostram que partidos
e/ou vereadores “ideológicos” foram campeões em votos localizados em um
conjunto compacto de bairros, enquanto partidos e/ou vereadores sabidamente clientelistas
ou fisiológicos obtiveram votação mais dispersa.
A
representação política abarca tanto o interesse geral como o específico,
especialmente quando as carências atingem amplas camadas. Como vimos em artigos
anteriores desta série, o município é o principal responsável pela educação
fundamental, a educação é fator determinante da qualidade do emprego que as
crianças terão daqui a dez, 20 anos, e a concentração de negros se dá nos
bairros mais pobres e, portanto, mais dependentes da educação pública. A
prefeitura tem, sim, papel a desempenhar nas políticas raciais, de educação e
de emprego. Vereadores têm muito a fazer para melhorar as escolas, criar
programas de emprego, de qualificação de mão de obra e medidas para diminuir as
desigualdades raciais. Podem fazer isso tanto por meio de legislação como de
sua participação no Orçamento municipal. Ao representar os eleitores de seus
redutos eleitorais, podem funcionar como um instrumento de informação sobre
suas carências e de pressão para a implementação de políticas e recursos para
combatê-las. Por que não deveriam buscar recursos para seus redutos eleitorais?
Se as carências não existissem, não haveria por que fazer isso. Se fazem, e sua
ação produz efeito, serão recompensados com votos. Cabe à disputa política e,
em parte, à Justiça eleitoral continuar a agir para evitar que, por meio de
“obras sociais” e outros recursos espúrios, candidatos tentem prover serviços
precários para “comprar” voto. Apenas por meio da participação eleitoral, a
população distinguirá o joio do trigo.
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